Em meu processo de amadurecimento cada vez fica mais claro que para mim a ordem do dia é ter conversações corajosas. O que são conversações corajosas? Todas aquelas conversas que precisamos ter conosco mesmo ou com os outros e que vamos adiando por uma série de razões.
Razões internas e externas (estas e muitas outras sempre fundamentadas nos nossos medos): receio de nos machucarmos ao enxergarmos a verdade; medo de perdermos a autoimagem que demorou tanto tempo para ser construída, temor de perdermos a impressão que o outro tem de nós (duplo engano); medo da reação do outro à nossa conversação corajosa; receio da eventual retaliação em caso de poder hierárquico; medo de perdermos amigos, relacionamentos e assim por diante. Às vezes até medo do medo de não sabermos como falar com o outro.
No entanto, no dia-a-dia tenho descoberto dois caminhos que funcionam muito bem ao ter conversações corajosas comigo mesmo e com outras pessoas: ser verdadeiro na expressão do meu sentir e ser amoroso.
Ser verdadeiro não significa ser o dono da verdade, mas estar bem consciente de que em determinada situação aquilo traduz uma realidade na qual eu vivo ou o outro vive. Se quero afirmar a “minha” verdade perante o outro, inevitavelmente estarei negando a verdade do “outro” e isto por si só gerará conflito.
Nas conversações corajosas quando ambos somos verdadeiros e amorosos surge a possibilidade de uma escuta ativa e de juntos resolvermos a situação criando uma terceira “verdade” (possibilidade) comum.
O que é ser amoroso neste contexto? É ser empático, colocando-se no lugar de quem vai nos ouvir, sentindo os mesmos sentimentos que teríamos se estivéssemos naquela situação. Um exemplo apenas para ilustrar: suponha que você entrou junto com seu colega ao mesmo tempo na empresa. Ficaram amigos, as famílias se conhecem, etc. Você é promovido a líder deste colega e precisa dar-lhe alguns feedbacks. Como começar esta conversação corajosa? De forma amorosa, por exemplo, dizendo-lhe que você terá de falar com ele, mas isto está gerando em você sentimentos tais quais: “é difícil para mim ter de lhe falar isto em função de nossa amizade, mas embora não seja fácil, tenho de que fazer porque meu cargo de liderança e minha coerência exigem isso”.
Mas é preciso ter a coragem para “ter a conversação corajosa”. O famoso ditado “conhecei a verdade e ela vos libertará” faz todo o sentido ao desmancharmos crenças ilusórias que nos limitam ou restringem ao outro e nos impedem de avançar, mudar ou crescer.
Ser verdadeiro é uma benção que nos liberta. No entanto, ser verdadeiro ao ter conversações corajosas geralmente coloca-nos (quando a conversa é conosco) ou ao outro na defensiva. A descoberta que fiz e que tenho praticado é a de ser verdadeiro com amorosidade.
Assim, por exemplo, entre lideranças e liderados em uma mesma organização há tantas coisas a serem ditas referentes aos “problemas” de trabalho, mas nosso medo de perder a amizade ou da reação defensiva do outro pode fazer com que fiquemos sem reação. Vamos refletir um pouco: se ficarmos sem ter as conversações corajosas que estes momentos exigem, estamos nos condenando a permanecer no estado de “coisas mal resolvidas”. A quem isto ajuda? A ninguém! Eu perco, meu colega perde, a organização perde porque não há mudança de comportamentos, processos ou rotinas. Vive-se o “estado do faz de conta”. Neste estado ninguém cresce. Pior que isto, como escolhi não ter a conversação corajosa necessária não posso também me fazer de vítima das circunstâncias.
Recordo-me de um trecho de “O livro tibetano do morrer e do viver” de Sogyal Rinpoche, que em 1999 me marcou profundamente com relação à amorosidade: “Como disse Stephen Levine: Quando seu medo toca a dor de alguém, torna-se piedade; quando seu amor toca a dor de alguém, torna-se compaixão.”
Sutil mas muito verdadeiro, não? A compaixão nos iguala na condição humana. Não somos nem superiores e nem inferiores e se a intenção de nosso coração é a de efetivamente ajudar uns aos outros a inclusão e a conversação corajosa acontecerão.
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