O colunista Marco Franzolim fala sobre as diferenças do stoytelling


Quem está empreendendo tem o sonho de criar uma marca que tenha conexões emocionais com o seu público. Que converse com ele e seja indispensável. E isso é compreensível. Empreender envolve envolvimento emocional. Sua marca é como seu filho.

Também é compreensível porque os novos empreendedores cresceram vendo (e admirando) empresas que tem uma história desbravadora, emocionante, com bons personagens e conflitos interessantes. Não é por acaso que marcas como Apple, Facebook, Twitter e etc são sempre citadas quando o assunto é empreendedorismo.

Para criar conexões emocionais da sua marca com o seu público-alvo você pode usar o storytelling. Funciona porque estamos acostumados a prestar atenção, reter e nos emocionar com histórias. Mas é preciso entender alguns limites éticos do storytelling corporativo, para ele não passar de lúdico para mentiroso.

Acompanhamos recentemente a discussão sobre a veracidade de storytellings de marcas como a Diletto e Sucos Do Bem. Não são histórias reais, mas ficções criadas para posicionar essas marcas e dar personalidades a elas perante seus públicos-alvo.

A última notícia sobre o uso do storytelling corporativo é da marca de roupas Hollister. Nos últimos dias essa história voltou à tona, com diversas matérias indicando que a ela não é verdadeira. Veja que a história tem todos os elementos necessários para a marca conversar com seu público-alvo:

A história é de John M. Hollister, um jovem aventureiro, com uma infância bucólica, recheada com as coisas simples da vida e em contato com a natureza, já que John cresceu surfando nas praias de Maine, EUA.

Mas John não parou por aí. Ele se formou em Yale em 1915, e, como ele não queria ter a mesma vida corrida que seu pai em Nova York, em 1917, John, com seu espírito desbravador, viajou para as Índias Orientais Holandesas, onde se apaixonou pela filha do dono da plantação de seringueiras em que trabalhava. O jovem casal apaixonado volta para Los Angeles com o sonho de abrir um loja de artesanato. A marca Hollister Co. começaria em 1922 quando o filho do casal, surfista como pai, ajuda na construção dessa marca. Bonito, né?

O problema é que, o que realmente aconteceu é que a marca surgiu em uma reunião dos executivos da Abercrombie & Fitch, no frio estado de Ohio. Sem aventura, paixão, veleiros, bucolismo ou artesanato. Nasceu como um business já bem estruturado pelos homens que o nosso amigo John Hollister não queria ser.

O que contar? Qual cenário posiciona melhor a marca perante seu público-alvo? Uma marca com espírito jovem, rebelde, apaixonado, aventureiro não pode ser fruto de executivos de uma grande corporação. Vamos pensar primeiro em analisar o storytelling:
É o storytelling perfeito para o público consumidor da marca. Se conecta emocionalmente com eles. Tem todos os elementos para isso: natureza, aventura, sonhos, terras exóticas, paixão.

Até aqui esse storytelling é justo. Uma história simples, recheada de clichês de filmes de aventura e romance que já vimos e que se conecta com esse público em específico. Mas, é certo inventar um storytelling que não aconteceu para vender uma marca?
Em um momento onde toda grande marca tem uma grande história para contar, seja da própria empresa, ou do seu fundador, nos parece que virou obrigação ter um bom storytelling por trás de qualquer empresa. Desde uma startup super antenada de tecnologia até a lojinha que vende paletas mexicanas. E, se essa grande história não existe, por que não criá-la?

Qual é o limite entre o lúdico e a enganação? Acredito que ele esteja no momento onde a sua história vende atributos que a sua marca não alcança. Se o storytelling da marca vende um produto com qualidade superior, ou qualidades que a sua marca não tem, ele está enganando o consumidor. 

A Diletto virou alvo de críticas com a linda história de um avô italiano apaixonado por sorvetes que vem para o Brasil com suas receitas especiais como um bem de alto valor. Sabemos que isso não aconteceu. É um segundo passo da criação do seu slogan: “La Felicità è un gelato”. É como se a marca continuasse ele, criando uma história de onde o slogan veio. Para mim é justo. Não engana o consumidor, não tenta vender um produto com qualidade inferior, ou coloca atributos no sorvete que no momento da compra, você não encontra.

O storytelling é perfeito para criar conexões. Posicionar e dar personalidade para uma marca. Essencialmente, ele é poético, criativo. Transporta-nos a um mundo onde todas as condições são favoráveis à marca. Só não pode vender algo não entrega.
Assim como a Diletto, penso que o storytelling da Hollister também é justo. Criou-se um universo ficcional onde o público-alvo da marca se sente confortável, e se conecta com a Hollister. Somos iguais, pensamos igual.  E enquanto estiver nesse campo, e não mentir sobre a sua qualidade ou a entrega do produto, funciona.

Aprenda sobre vendas no meuSucesso.com. Experimente por 7 dias grátis.

Marco Franzolim

É sócio-diretor de comunicação da MonkeyBusiness, agência de apresentações, e professor, ministrando aulas na ESPM e cursos in company para empresas como Banco do Brasil, SEBRAE, GM, Red Bull, Via Varejo, Boehringer, Telefônica, Almap BBDO e JWT. Sua experiência no mercado inclui mais de 2500 apresentações para mais de 400 empresas, entre elas as maiores empresas do Brasil como AmBev, Visa, Natura, Danone, Nestlé, Coca-Cola, Bradesco, Globo, Nike, Santander entre diversas outras.